registos, leituras, ecos, palavras, imagens, gestos, passos de dança e ensaios de voo...
aromas e sabores que (a)guardo carinhosamente





domingo, 30 de maio de 2010

re... começar (III)

Juntos na cidade das luzes, sob uma chuva torrencial pouco usual, pasmados com os relâmpagos e os trovões, sorriem e murmuram baboseiras, soltando gargalhadas ocasionais que acompanham na perfeição a troca de carícias atrevidas.
Decidiu leva-la a percorrer as principais artérias da cidade antes mesmo de lhe dar a conhecer a sua nova casa. Ao ritmo acelerado do seu coração, irrompendo na madrugada tempestuosa, surgem os detentores dos grandes nomes parisienses: Torre Eiffel, Louvre, os fantásticos Champs Elysee com o seu Arco do Triunfo a finalizar a avenida, Notre Dame, Sacre Coeur, Versailles... ela vai soltando notas de prazer e de espanto, espreitando por entre os limpa-pára-brisas apressados, ou entre as pesadas gotas de chuva que a molham abundantemente sempre que insiste em descer o vidro para sentir o cheiro do local. Apresenta-lhe o Sena, o apaixonante rio que corta a cidade em arco, promete-lhe uma viagem de barco num roteiro semi-turístico, dado que o seu conhecimento da cidade lhe permite oferecer mais, muito mais do que os lugares de visita obrigatória.
Olha-a encantado, não se cansa do seu sorriso ou do brilho dos seus olhos, não sendo uma mulher bonita, é decerto uma companheira alegre e divertida.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

...

perdoa-me as lágrimas infantis e trapalhonas, a ausência de savoir faire, a impertinência dos pedidos que te faço mentalmente para que voltes... perdoa-me se não sei viver sem ti, ou sem a tua presença - promessa de futuro. perdoa se em plena primavera insisto em ter frio e a cobrir-me de choros convulsivos e soluços escondidos... sabes, por vezes, criamos imagens, antecipamos cenários, imaginamos sentimentos, sonhamos, sonhamos, sonhamos e sem dar por isso vivemos algo que não existe... acabei a acreditar no que criei, abstraí-me da realidade certa de que o presente era apenas mais um de tantos obstáculos que a vida nos ensina a transpor. fui eu quem não regressou atempadamente, não querendo aceitar que a vida pode mais, que o tempo rege os dias e que querer não é poder... ou que o adeus seria inevitável.

partiste e não te censuro. sei que a vida é um rio imparável, um rio que corre beijando as margens, alimentando as árvores e as flores, acariciando as aves (que são os nossos sonhos), mas sempre, sempre avançando... às vezes mesmo galgando os sulcos mais profundos, outras vezes arrepiando caminhos, ocasionalmente existem momentos de calmaria mas não há barragem que nos sustenha eternamente, o destino é o mar... ou o amar, como um dia acreditei... tu partiste, e eu não queria...

quinta-feira, 27 de maio de 2010

dias sem sol

"no escuro da noite o sol aguarda a sua vez"


(Photo on deviantART)


reflexo, o luto, emerge
em vários tons
negro-sombrio
negro-carvão
breu-estrelado
escuro-enluarado
preto-raiado de luz
preto-saudade
pardo-madrugada
num arco-íris de dor!

terça-feira, 25 de maio de 2010

(re)... começar (II)

As nossas mãos não se separam, como se fosse impensável passarem um segundo sem se sentirem, pousamos o olhar um no outro e eu vejo no teu rosto o reflexo do meu sorriso. Os nossos lábios tocam-se em mais um beijo inconsciente que se prolonga, enlaças-me pela cintura e sinto o teu corpo colado ao meu, envolvidos num abraço apertado testamos a intensidade do desejo latente.
A brisa marinha faz esvoaçar as cortinas leves espalhando o aroma do café e das torradas acabadas de fazer. Sentamo-nos frente a frente partilhando com vagar a primeira refeição do dia, comendo e conversando, revendo os planos que alinhavamos para hoje. Confesso que sinto alguma preguiça, e uma enorme vontade de me voltar a aninhar contigo na cama perfumada que ainda há pouco abandonamos. Sei, no entanto, que o interlúdio junto ao mar está a terminar, e que a cidade chama por nós. Irei finalmente conhecer as ruas onde te perdes em caminhadas domingueiras, as praças e recantos que conquistaram os teus olhares mais demorados, o rio que te seduz diariamente. Estou particularmente curiosa em descobrir os cheiros e os sabores locais, o encanto das pessoas, os espaços e as cores que habitualmente te rodeiam.
Esta aventura, mil vezes sonhada, parece ainda irreal, e nem a tua mão meiga e firme consegue fazer dissipar a minha ansiedade escondida.

domingo, 23 de maio de 2010

parte assim... cavaleiro andante



1967/2010

até que a dor se esgote


(Photo on deviantART)

gotas de fel
queimam
lábios mel
onde floresciam
sorrisos
transparentes

inacreditável
a pureza de quem
ama sem esperar
a fria e cruel
insensibilidade
dos que julgam
sem ouvir

insuportável
o cansaço
de quem deseja
corrigir o incorrigível

amontoam-se
nuvens sombrias,
esconde-se o sol,
e as lágrimas formam
carreiros que sulcam o rosto...

[imparável este choro compulsivo e involuntário]

quinta-feira, 20 de maio de 2010

urbanidades

podia falar-te
de sol e de sombra,
do azul mais-azul
ou do perfume das flores
que (re)descubro a cada dia

podia contar-te
os sonhos
e os desejos
que me inspiras,
ou descrever-te
a rota dos ponteiros
do relógio da avenida
que me olha
adivinhando-me
a pressa de chegar a ti.

podia ainda escrever
sobre o abanar de cauda
que conta os segundos
que não nos aproximam
mas marcam o compasso
do tango que não sei,
- mas quero...

podia soltar o cabelo rebelde
- que espera os teus dedos,
e me rodeia o rosto
dançando enquanto caminho
(des)preocupada e muda,
surda para o mundo,
atenta apenas aos teus olhos
furtivos e singulares.

podia...
mas (a)guardarei o beijo
que me virá despertar,
e depois sim...

quarta-feira, 19 de maio de 2010

(re)... começar(I)

Quando por fim voltares, traz no olhar
a nesga de areal onde algum dia
te encontrei entre a espuma e a maresia,
passeando a surpresa de haver mar.


Torquato da Luz
.
(Photo on deviantART)
.
As janelas abertas permitem uma magnífica visão do local, lá fora o oceano acinzentado ruge imparável, o vento traz o cheiro da maresia e ouvem-se os gritos das gaivotas.
O sol brinca ao esconde-esconde com as nuvens, em breve, os vidros serão açoitados pelas gotas da chuva anunciada. De momento a luminosidade intensa fere a vista, o dia amanhece prenhe de promessas, e o brilho no seu olhar denuncia a feroz intenção de o viver em pleno.

azul cobalto




em quaresma de sombras
aguardo a redenção
das (in)verdades escondidas
em olhares transparentes

bravio o mar que separa
muances e promessas
que acolho porque quero

faço caminho, navegando
em águas turvas, agitadas
por vozes estridentes
de pássaros de arribação
- que não são gaivotas

contorno escolhos
e continuo, correndo riscos,
escolhendo... acertando, errando...




[o teu nome colado no lado esquerdo do peito]

segunda-feira, 17 de maio de 2010

backup plan (I)

(Photo by gusiia on deviantART)

comida japonesa seguida de comédia romântica e gelado de baunilha saboreado à beira-rio
enquanto o pôr-do-sol se reflecte na fachada dos edifícios da cidade [que não dorme]






the cherry on the top of the cake?
a great night sleep ;)

domingo, 16 de maio de 2010

entre o céu e a terra

 A linguagem é uma fonte de mal-entendidos.

Antoine de Saint-Exupéry, in O Principezinho
 
   
(Photo by sugarock99 on deviantART)

esconder num sorriso
a mágoa de não ser tua.
esquecer lágrimas
que não me pertencem.
sorrir e avançar,
afastar obstáculos,
rasgar caminhos,
percorrer novos trilhos.

- é esta a matéria que me compõe

sexta-feira, 14 de maio de 2010

palavras (I)

(foto de Sofia Azevedo)

palavras
que se cruzam
com os passos
ao sabor
dos laços
que se embaraçam
nas palavras
entrelaçadas
que nos calam
e confundem

palavras
que se escondem
dos actos
e dos factos
se a verdade
nua e crua
nos assusta
ou nos afasta

palavras
que nos aquecem
e iluminam,
quebrando
silêncios
de cristal
(des)complicando
os emaranhados
sentimentos
que me
p e r f u m a m
os dias

[palavras, que são, simplesmente, tudo... quando nada mais existe]

quinta-feira, 13 de maio de 2010

noites

(Photo by guyfromczech on deviantART)


despertar
ao som
do canto
dos pássaros
irrequietos
que vivem
nas árvores
sobranceiras
à janela
do meu quarto
- os mesmos 
que gulosos
comem
os figos
de agosto.

mas, que não me acordam porque tu chegas antes de qualquer presságio de primavera
qual fruto vermelho (em qualquer estação)...

e assim
os teus lábios
beijos
e desejos
me iluminam
nas noites
claras
de lua cheia

quarta-feira, 12 de maio de 2010

olhares

(Photo by sleena on deviantART)

densos 
os labirintos
que percorro
destemida...
trilhos solitários,
praias desertas,
lugares imaginários
p'ra onde parto
ao meu encontro
enquanto o sol se esconde

caminhando
contra o vento
fantasio
o sabor marinho
(pres)sentindo
a maresia
que trazes no olhar
onde um raio de sol
s o r r i
em promessas de mel

segunda-feira, 10 de maio de 2010

presente


(Photo by ollaaa on deviantART)

vens de mansinho cruzando céus azuis e mares de algodão. (des)envolto em palavras claras, chegas construindo castelos de açúcar que se (me) derretem na boca e se (me) colam no peito quais tatuagens de (a)mar. (en)cantador de sorrisos, que se enlaçam nas lembranças que atravessam oceanos carinhosamente embrulhadas em ninhos de solidão agasalhadas com beijinhos em esperas demoradas; delicadeza e exotismo feito arte de apaixonar...
assim tu,
música sem par,
estrela-do-meu-(a)mar
presente do meu sonhar

domingo, 9 de maio de 2010

(soul?!) mate


o vento embala
almas e sentimentos
dependentes de horas
e marés, agitando véus
levantando nevoeiros

vozes recicláveis
revelam a cor das palavras
férteis em sentidos
duplos e dúbios, múltiplos
e multiplicáveis por olhares
maldosos de homens
que nada temem

é bom ter sono e fome e frio;
temer, respeitar, honrar,
poupar, mulheres frágeis
de cabelos finos, aureola
em riste e máscara no rosto

impensável borrar o retrato
embaciado, desenhado sem rigor
mas com preci(o)sos traços
de irascível jogador de xadrez
que sacrifica torres, bispos,
cavalos e peões, mas salva
sempre, sempre a rainha!...
 
 

escrito algures em 2008

quinta-feira, 6 de maio de 2010

realidades...



nos olhos mar
esconde o medo
e afoga a solidão;
verde olhar imenso
triste reflexo do oceano
e das revoltas esmagadas

p e r m a n e c e r 
é uma ordem
que não cumpro impunemente;
guardar o grito
que lavra no peito,
calar a voz
das sombras, dos fantasmas,
dos sonhos por viver...
não me impedem de sentir
a ausência do sorriso
ou a musicalidade das lágrimas contidas...

mergulho no aroma a maresia
sorrio e deixo que o sal
me doure o rosto e os cabelos de vento e luz,
ofereço o melhor de mim
nesta gota de água pura
que cai nas minhas mãos pequenas
de mulher despida de ilusões...

[rebelde a sensualidade que teima em romper: arrebatamento e paixão confundem pudores que se escapam pelas janelas abertas sempre que o (a)mar me chama]

quarta-feira, 5 de maio de 2010

para além do amanhecer

(Photo by karinelips on deviantART)

história que não vivi,
saudade do que não foi?

sorriso presente,
sonho que desponta,
desejo que floresce!

amanhecer solarengo
nos dias que crescem?

lágrimas adiadas
ou apenas...
palavras que invento para apagar a solidão!?

terça-feira, 4 de maio de 2010

(in)quietude

Em nome da tua ausência
Construí com loucura uma grande casa branca
E ao longo das paredes te chorei

Sophia de Mello Breyner Andresen



pensamentos sombrios
insónias e uma solidão sem fim
a dor de ficar sem não saber onde ir
janelas abertas sem que o ar se renove
paredes mudas e portas cerradas

sol que não queima
vento que não sopra
água que não pára de correr
nos olhos que são foz
de um rio que nasce em mim

(Photo by Kashimana on deviantART)


é a tristeza que se instala!

domingo, 2 de maio de 2010

dias e mães

escrevo num misto de raiva e dor. sentimentos confusos e dolorosamente avassaladores antecipadamente conhecidos, mas ainda assim, inevitáveis. avalanche de contradições a que voluntariamente(?!) me submeto neste dia da mãe que a cada minuto me recordam... e que se repetirá em oito dias!... dias da mãe que sou - sabendo-me mãe perdida e solitária, quantas vezes insatisfeita e irascível (particularmente em momentos como este)... dias da mãe que tenho - deprimida e só, infinitamente triste e desiludida com a vida (com a vida que tem, com a vida que teve, com a vida que vislumbra...)... dias da mãe adolescente que é a minha filha - apaixonada pelo seu rebento, mas contrafeita com as responsabilidades precoces e intransmissíveis que a sufocam... dias da mãe que desoladamente perdi há ainda tão poucos dias, mas que foi desde sempre o meu exemplo por excelência de maternidade assumida, educadora, companheira, conselheira, presença constante em cada curva do meu caminho, na alegria e na tristeza durante toda a sua vida... dias da mãe que sempre desejei ser (vontade que Deus cedo concretizou na minha vida) - sim, porque constituir família sempre foi o meu maior anseio, apesar da aparente incoerência dos sentimentos que acabo de expor... dias da mãe que não me deixam esquecer... o tanto que ficou por fazer, a minha insignificância, a minha incapacidade de ser mais e melhor... dias que demoram a passar!
"De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua"

Sophia de Mello Breyner Andersen

(Photo by Chopen on deviantART)


vivia dias sem sol,
sentia o frio, a neve, a chuva...
sonhava o passeio a dois
e a mão na mão;
vertia o mar nos olhos
fixava a linha do horizonte
era onda e fugia no areal,
corria sem medo
e escrevia na volta da maré
palavras proibidas
repletas de sabores e aromas
para acalmar a saudade

ao anoitecer
colhia reflexos de sol e de (a)mar,
misturava as cores com carinho
e pintava sombras
de (e)ternos amores
i n t e r d i t o s,
s o l i t á r i o s,
p r o i b i d o s

água, sal,
recortes de espuma,
estrela-do-mar,
concha vazia,
cavalo marinho,
areia molhada

era... onda
e morria na praia a cada volta da maré!